O Programa Falou e Disse recebe Eulália Alvarenga e Gilson Reis.

EULÁLIA ALVARENGA

Essa mineira é mais do que uma mulher economista, auditora fiscal ou ex-integrante da Auditoria Cidadã da Dívida Pública. Ela representa a continuidade dos movimentos de libertação Colonial do Brasil que irrompe em Minas Gerais desde o século XVIII com muita força, a chamada Inconfidência Mineira. Apesar do movimento ter sido reprimido, deixou um legado de independência passando a ser um símbolo do desejo de liberdade potencializando a força da resistência. Essa Terra do ouro e da avidez da conquista, até hoje, exerce também um fascínio em políticos e administradores sedentos de ganhos fáceis e, não mais que de repente encontram uma oposição ferrenha daqueles que sabem se unir e lutar contra os desmandos e ações que ameacem sua autonomia de povo. Afinal Minas foi pioneiro na formação de uma identidade raiz e cedo ou tarde soube sempre responder às arbitrariedades dos Governantes e, essa forma crítica de ser, não nega a herança entranhada na alma de seu povo, até os dias atuais. O movimento dos atingidos pelas barragens nunca irá desistir dos seus objetivos e daí queremos hoje, dar maior visibilidade e se possível a nível nacional, do profundo significado da resistência de Eulália Alvarenga frente ao Núcleo duro de duas empresas tipo “unidas venceremos” num conluio de gêmeos vitelinos público-privado a PBH Ativos S.A, com participação do BTG Pactual.

A PBH Ativos S.A foi criada pela Pref.de BH em 2010 na gestão do Pref. Márcio Lacerda como uma sociedade anônima de capital misto, majoritariamente pública, com o objetivo de captar recursos financeiros por meio da securitização da dívida ativa de BH e da emissão de debêntures. A Empr. também ficou responsável por gerir obras de infraestrutura e parcerias público-privada (PPPs).

Resumo do imbróglio: passou a funcionar como um “banco paralelo” da Prefeitura, mas sem mecanismos de controle do setor público. E isso permitiu dinheiro e patrimônio público sem licitação, sem passar pelo orçamento e nem mesmo pela fiscalização mais do que tradicional tanto do Legislativo quanto do Tribunal de Contas.

E aí que o trabalho competente e eficiente da mineira, não vamos nos esquecer, entra em cena. Claro que como economista e auditora tanto fiscal como do endividamento público, conhecia todo os meandros, o arcabouço e o direcionamento dos investimentos. Sabia com muita clareza, onde era o caminho das pedras ou do ouro de Minas. E suas críticas foram contundentes e apontavam a falta de transparência e controle social nas operações da PBH Ativos S.A. Como uma Empresa podia operar com recursos públicos sem estar sujeita às mesmas transparências das entidades públicas, dificultando assim o acompanhamento pela sociedade? Além disso, o Município de Belo Horizonte, para aporte de capital da PBH Ativos, doou 53 imóveis pelo “valor mínimo”, sem nenhuma informação sobre como foram apurados esses valores e porque era valor mínimo e não valor de mercado. Tais imóveis eram para ser usados como garantias em parcerias público-privadas pela S/A. Várias associadas de bairros questionaram a doação desses imóveis porque havia demandas de terrenos para creches, parques e postos de saúde. Para comprovar o valor irrisório dos Imóveis transferidos pelo município, foi realizada pesquisa pelos estudantes da Escola de Arquitetura da UFMG, que mapeou os imóveis juntamente suas localizações e valores de mercado. O trabalho comprovou a brutal transferência de patrimônio público para uma S/A (PBH Ativos S/A.). A Empresa tentou vender 20 desses Imóveis por meio de leilão, que acabou suspenso por Ação Popular.

Tudo isso levou à abertura de uma Comissão de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal de Belô para investigar a Empresa citada. Também o M.Público de Contas de Minas Gerais, encaminhou representação ao Tribunal de Contas do Estado, solicitando medidas cautelares em relação às operações da empresa.

Eulália por sua audácia foi alvo de um processo judicial movido pelo ex-prefeito Márcio Lacerda, que a acusou de calúnia e difamação devido às suas declarações públicas.  Fazendo um parêntese para conhecer um pouco mais a corajosa Eulália, ela há muito tempo já vinha desempenhando um trabalho voluntário, de muito gabarito e qualificação como o “Tarifa Zero”. Sem ela seria impossível saber de imediato que estava em Curso a securitização da Dívida ativa que são os valores que empresas e pessoas devem à Prefeitura. O que isso significa? Emissão de debêntures com base na dívida ativa do Município. E daí não entendeu nada? Claro o Município organizando seu Cassino? Antecipando receitas futuras, vendendo seu direito de receber esses créditos, um processo além de opaco ou sem visibilidade e de baixa eficácia. E o BTG Pactual ou pactuado com o Diabo foi o único banco que participou da licitação, vencendo sem nenhum concorrente por perto. Para muitos analistas esse modelo tem um risco de efeito cascata nacional pois muitos vão querer imitá-lo e fazer igual pois se torna uma espécie de laboratório de uma nova forma de financiar o Estado. Além do que o modelo abre precedentes para a “financeirização” da gestão pública, transferindo o controle de recursos estatais a bancos e investidores.

Eulália se destacou ainda pelo seu trabalho em desvendar a caixa preta das empresas de transporte em Belo Horizonte. Denunciou o funcionamento nada transparente de um sistema que envolve bilhões de reais em recursos públicos e tarifas pagas pela população. Qual foi o seu método: utilizou seu conhecimento técnico já mencionado para investigar contratos de concessão, balanços financeiros e modelos de remuneração das empresas de ônibus. Mesmo sendo uma tarefa cansativa e não remunerada, se debruçou sobre as planilhas de custo operacional feitos com o objetivo de justificar o aumento das passagens; examinou as isenções fiscais e subsídios dados pela Prefeitura e comparando e contabilizando tudo isso com os contratos entre a PBH e os Consórcios de Transporte. Fico imaginando quantas mutretas não deve ter encontrado. Mas em suas denúncias constata o quanto os lucros são garantidos aos empresários, mesmo com um serviço ruim ou abaixo da crítica. Outra aberração o poder público não tinha acesso pleno à quantidade de passagens vendidas e o pior, o sistema não permite auditoria pública apesar de envolver dinheiro da população. Sem querer me alongar enfatizo a colaboração da nossa “Tiradentes” na CPI dos transportes na Câmara Municipal de BH. Eulália realmente incomodou interesses fortes e obviamente foi alvo de pressões e tentativas de silenciamento, além dos processos judiciais já relatados. Mesmo assim, seguiu denunciando os conluios e acordões entre o poder público e os empresários. E tentando fazer a sociedade entender como a financeirização das políticas públicas são prejudiciais tanto à gestão pública que tem seus recursos desviados com outras finalidades como as privatizações de escolas infantis, via parceria público-privadas e que entregou a gestão das UMEIS (Unidades Municipais de educação infantil) para a Construtora Odebrecht. Foi uma concessão profunda tanto da estrutura quanto do funcionamento das escolas, comprometendo recursos públicos a longo prazo, com baixa participação popular e favorecendo grandes empreiteiras.

Seus relatórios técnicos são extremamente detalhados com minuciosa coleta de todas as evidências e dados numéricos e, não vamos nos esquecer que isso tem respaldo na sua experiência acumulada de auditora por anos e anos. Esse trabalho, sem esquecer a palavra “voluntário”, se vê diante de operações de complexidade avassaladora para o comum dos mortais não treinados para decifrar os engodos por trás dos números. Daí porque no seu prosseguimento deve encontrar apoio dos Tribunais de Conta e dos Ministérios Públicos e também da isenção da CPI instalada para esse fim.

Se diz que nos Brasil tudo acaba em pizza mas nesse caso Eulália Alvarenga logrou sucesso sendo absolvida e isso refletiu também em conquista para os numerosos movimentos sociais que a apoiaram garantindo assim a liberdade de expressão. A análise ou interpretação feita pelo conjunto da sociedade em relação a audácia do Prefeito na tentativa de judicializar a questão foi uma forma de pressão contra a oposição feita pelos movimentos sociais e uma tentativa de abafar as investigações que reuniu várias entidades, associações, sindicatos, grupos da universidade, partidos, etc. Enfim, a tentativa de intimidação de alguns grupos iniciantes só serviu para recrudescer, ampliar e unificar as forças de luta. E no final a verdade venceu o conchavo, a prevaricação, o engodo e Eulália saiu vitoriosa neste embate dos fortes.

Vejamos as Associações, etc que assinaram a nota:

1-         Associação Metropolitana de Estudantes Secundaristas da Grande Belo Horizonte -AMES -BH

2-         Assoc.Sind.dos Empreg.Públ.Estad. da MGS – ASSEPEMGS

3-         Brigadas Populares

4-         Casa de Referência da Mulher Tina Martins

5-         Centro Comunitário do Taquaril

6-         Centro de los Derechos del Campesino

7-         Consulta Popular

8-         DAEA – UFMG

9-         Diretoria da Associação dos Docentes da PUC Minas

10-       Diretório Acadêmico Carlos Drummond de Andrade – Da Letras

11-       Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social

12-       Federação Nacional dos Estudantes em Ensino Técnico – FENET

13-       Federação Nacional dos Serviços dos Tribunais de Conta

14-       Grupo de Estudo da Fundação Brasileira de Direitos Econômicos

15-       Grupo Indisciplinar

16-       Intersindical

17-       LAB.URB – Escola de Arquitetura – UFMG

18-       MAMBH – Movimento das Associações de Moradores de Belo Horizonte

19-       Marcha Mundial de Mulheres

20-       Movimento Correnteza

21-       Movimento da Soberania Popular frente à Mineração – MAM

22-       Movimento de Luta nos Bairros e Favelas – MLB

23-       Movimento de Mulheres OLGA BENARES

24-       Movimento dos Atingidos por barragens – MAB

25-       Movimento Luta de Classes – MLC

26-       Movimento de luta pela moradia -MG (MNLM/MG)

27-       MTD

28-       Núcleo Gaúcho da Auditoria Cidadã da Dívida

29-       Núcleo Habitacional Central do Estado de Minas Gerais

30-       Núcleo Mineiro da Auditoria Cidadã da Dívida

31-       Núcleo Primeiro de Maio da Auditoria Cidadã da Dívida

32-       POEMA

33-       Red de Organizaciones Sociales de Managua, Nicaragua

34-       Salve Santa Teresa

35-       Sindicato dos Auditores Públicos Externos do TCE -RS

36-       Sindicato dos Advogados de Minas Gerais (SINAD-/MG)

37-       Sindicato dos Economistas de Minas Gerais -SINDECON

38-       SITRAEMG

39-       Somos Todos Contra a PBH Ativos

40-       Tarifa Zero BH

41-       União da Juventude Rebelião -UJR

42-       Unidade Popular pelo Socialismo

 

Por: SOMOS TODOS C ONTRA A PBH ATIVOS S/A

Concluindo, temos acima uma amostragem da participação de 42 Entidades desde as populares, mas também universitárias, passando por variadíssimos movimentos sociais, por Sindicatos e Federações. Qual foi o elo de união das forças? Não tenho dúvida de que a cultura de luta e resistência de Minas Gerais esteve presente. A petulância e desprezo dos pretensos mais fortes foi um fator de   potencialização da revolta coletiva.

A Câmara de Vereadores da cidade teve também um notável protagonismo, tanto assim que Eulália fez questão de não vir ao nosso programa e falar sozinha. Trouxe junto GILSON REIS, o ex-vereador de Belo Horizonte, plural e versátil em sua formação que vai da Biologia à Economia e Mercado de Trabalho através da UNICAMP, além de um mestrado na área do Direito Ambiental. Extrapolando teorias e conhecimentos acadêmicos também engrenou na luta quotidiana como presidente do Sindicato dos Professores de M.Gerais; Coordenador geral da Contee (Confederação Nac. dos Trab. em estabelecimento de ensino) ;Diretor da Executiva Nacional da CUT e da CTB Minas, além de Diretor de Projetos da Fundacentro Minas Gerais. Com todo esse cacife entrou na política com experiência e competência exercendo o cargo em 2 mandatos. E tem mais, é autor tanto de Projetos de Educação, Meio Ambiente e Cultura como de Livros “PRÉ SAL O FUTURO DO BRASIL E SUA IMPORTÂNCIA PARA A SOBERANIA”; “DESAFIOS DO MOVIMENTO SINDICAL BRASILEIRO” e “DESVENDANDO MINAS”. Por essas e por outras um só programa para levantar tantos temas absolutamente insuficiente. 

Ficamos por aqui, mas com a certeza de que teremos muito em breve outras conquistas nos mostrando com quantos paus se faz uma canoa.

NITERÓI, 18 maio de 2025.

Helena Reis