O Programa Falou e Disse recebe Denise Lobato Gentil.

Denise Lobato Gentil é formada pela Universidade do Pará e Doutora pela UFRJ. Ela vem se destacando no Rio de Janeiro após sua Tese de Doutorado sobre o “Mito” implantado há anos sobre a Falência da Previdência. Essa mulher vibrante e contundente foi capaz de desmontar de forma avassaladora a grande farsa propalada aos quatro ventos pelos arautos do Governo Temer de se fazer a Reforma à toque de caixa através da PEC 287.

A Previdência é apenas um dos pilares da Seguridade Social que inclui a Saúde e a Assistência Social e isolá-la, foi uma forma satânica de semear a confusão, mentira e perplexidade no seio do povo. Sua reforma só beneficiaria banqueiros e rentistas. A Constituição de 88 foi um instrumento de transferência mínima de renda de ordem inclusiva e progressista. A reforma iria desconstruiu tudo o que foi previsto. Nessa ocasião surge Denise Gentil como uma das maiores autoridades no tema, indo inclusive ao Congresso Nacional levando seus conhecimentos para o Plenário da Câmara numa Audiência Pública analisando com competência, vigor e coragem com base em dados e estudos, todas as implicações e consequências negativas da Reforma. Vejamos os principais pontos:

1 – Ao longo de 2005- 2015 não houve déficit estrutural na Previdência como os arautos do Governo propalavam aos 4 ventos. Muito antes, pelo contrário o Sistema Previdenciário apresentou superávit de cerca de R$ 957 bilhões, recursos que Denise aponta terem sido desviados para cobrir outras despesas, mas não reapresentados quando veio a “crise” pautada na justificativa do falso problema.

2 – Uso seletivo e alarmista de dados fiscais. “Gentil” com firmeza, acusa o Governo de manipular o medo da população divulgando estatísticas pontuais e aleatórias como por exemplo projeção de R$ 290 bi de futuros débitos, mas, sem apresentar histórico completo de receitas e despesas como é de praxe em qualquer análise séria de projeção econômica futura. E na continuação na mesma toada, continuaram a enfatizar a falência nos anos vindouros, ignorando e omitindo as receitas perdidas por incapacidade de gestão. Nunca também foi dado devido destaque aos fatores que drenam receitas da Seguridade Social tais como: dívida ativa das Empresas à Previdência em cerca de R$ 427 bi e em atraso; renúncias fiscais que chegam a trilhões de reais (Repetro, DRU); Sonegação e desonerações que somam centenas de bilhões por ano.

3- A Reforma penalizava os mais pobres. Ao elevar a idade mínima e tempo de contribuição a proposta afetava especialmente os trabalhadores informais e os de menor renda. Na época 23 milhões de pessoas recebiam apenas 1 salário mínimo e isso sem colocar na roda os que viviam de trabalhos informais ou periódicos.

4 – Visão restrita de “enxugar gastos” ou o samba de uma nota só como meta única. Denise já via com clareza que o verdadeiro nó fiscal não é o gasto previdenciário (que sozinho não explicava o crescimento da dívida) mas, o serviço da Dívida Pública e a opção política de priorizar o superávit primário que transfere a renda do trabalhador ao credor financeiro.

Ao sigilo absoluto sobre o destino dos Superávits passados ela questiona como um mantra: “para onde foram os R$ 957 bilhões de superavit“? E por que não foram colocados num fundo para serem resgatados em momentos de crise? Assim mostra enfaticamente, como a narrativa da conta zerada não se sustenta e daí com razão acusou Governos passados de “forjarem uma crise” previdenciária por meio de: contabilidade seletiva, alarmismo estatístico e omissão de receita enquanto a referida proposta só serviu para aprofundar desigualdade e transferência de renda dos trabalhadores mais vulneráveis para o serviço da Dívida e dos Fundos Privados.

Em resumo são tantos pontos que chega a ser cansativo para nós leigos nos inteirarmos de tudo, mas, para aqueles que gostam de ir mais fundo podemos através de Denise cutucar a onça com vara curtíssima. Já falamos da omissão dos superávits e da divulgação apenas do resultado zerado em déficits, mas, não mencionamos com detalhes o desvio de recursos para outras rubricas do orçamento e também porque ignoravam ou não incluíam na contabilidade as receitas das contribuições atrasada. Olha essa falha e pior, produzida de forma intencional. Outro jogo de cartas marcadas: O Governo “esqueceu” de contabilizar R$247 BI em cobranças pendentes de Empresas Informais e Entes Públicos e é claro essa inclusão reduziria ou eliminaria o déficit projetado. Ao fim e ao cabo o Governo no passado se recusou a detalhar publicamente o déficit alardeado e que só foi declarado por meio de ação civil pública ajuizada pela FENAJUFE e isto, após determinação judicial.

A Reforma da Previdência não logrou êxito no período Temer, mas, assim que entrou Bolsonaro esse anseio espúrio do Governo voltou à tona com mais força e propostas, ainda mais indecorosas. Uma delas, foi a ideia de implantar um sistema de capitalização, em que cada trabalhador faria sua própria poupança individual. Denise desvenda com facilidade essa nova armação, afinal era Paulo Guedes quem estava por trás de tudo e queria seguir a fórmula falida que foi implantada no Chile e outros países da A. Latina. Como todos sabem esse senhor pertence ao mercado de capitais, é, portanto, o homem ligado ao sistema de financeirização e consequentemente queria se apossar do dinheiro das aposentadorias para movimentar mais ainda o cassino virtual dessa prática, ou seja, o Governo abandonaria suas responsabilidades e entregaria a uma população absolutamente despreparada o seu parco recurso de poupança que no futuro, a partir da aposentadoria seria a garantia de sua continuidade salarial. Esse plano felizmente naufragou, mas, outras variáveis ocorreram.

A Emenda Constitucional no 103 foi promulgada em novembro de 2019. Suas principais mudanças se referiram a idade mínima e o tempo de contribuição com diferenciação entre homens e mulheres. Havia diferenças entre os Setores Públicos e Privados, mas, sobre essas particularidades não quero me alongar por serem hoje do domínio público. Outra mudança essa mais significativa foi a nova fórmula de cálculo do benefício. O valor da aposentadoria passou a ser 60% da média salarial e mais 2% a cada ano que ultrapasse os previstos 20 anos de contribuição. Ou seja, a ideia de se aposentar na data prevista deveria ser postergada para que a média salarial aumente ou seja em 30 anos de trabalho o ganho seria de 80% e em 40 anos de 100%. Ora, para uma realidade de salário já baixo esse foi o grande incremento para ninguém querer se aposentar. Outra “pegadinha” para adiar a aposentadoria é a obrigatoriedade de cumprir a idade mínima estabelecida, ou seja, quem começou a trabalhar cedo não seria premiado, mas sim penalizado pois teria de ultrapassar sem nenhuma benesse os seus anos de trabalho. Houve também redução de valores nas pensões por morte: Uma viúva passou a receber 50% da aposentadoria do marido e mais 10% para cada dependente. Antes a viúva recebia integralmente os 100%.

Finalmente não posso passar batida na perseguição feita aos professores homens ou mulheres. A reforma caçou a prerrogativa anterior dos 5 anos de idade a menos, em relação as demais categorias em função do desgaste do trabalho docente. Após a reforma a idade passou a 60 anos para os homens e 57 para as mulheres com tempo de contribuição mínimo de 25 anos para ambos. Enquanto isso, os policiais nessa mesma Reforma Previdenciária conseguiram preservar muito mais direitos. Por que essa diferenciação. É óbvio que os policiais foram mais protegidos por constituírem a base política e ideológica do Governo Bolsonaro fortemente apoiado por policiais militares, civis, federais e bombeiros. O número de assessores militares no Governo atingiu um patamar nunca antes visto nessa país. E ainda assim, a categoria já premiada fez pressão organizada no Congresso que culminou algumas vezes até em ameaças e retaliações eleitorais caso suas aposentadorias igualassem às dos simples mortais civis. E vamos convir que a categoria de policiais federais e militares é muito menor que o no de professores os quais iriam onerar bem mais a economia fiscal. E concluímos ao ver a “militarização da política citada acima como isso refletiu nesse favorecimento e benesse e isto sem fazer uma análise mais profunda do desprezo bolsonarista por tudo que significa conhecimento, aprendizagem, escolaridade, conceitos e práticas necessários num país soberano.

Chegando aos dias atuais surgem novas armadilhas agora em nome da substituição do antigo teto de gastos por um novo arcabouço fiscal. O povo não tem noção nem dessa linguagem que interpreta problemas fora de sua alçada quotidiana e que se chama Dívida Pública. Muitos países do mundo em seus gastos públicos e transações comerciais acabam virando “devedores”. Entretanto não podemos nos esquecer que o país que mais canta de galo e quer sempre oprimir as nações são os EEUU e que por ironia ou não, é o país mais devedor do mundo, E que hoje está próxima dos US$ 36 TRILHÕES de dólares. E ele ao contrário não sofre nenhuma sanção e nem cria Leis restritivas a gastos, seja para o que for. Nós ao contrário, temos de baixar a cabeça e ser filhotes comportados, abandonando projetos de desenvolvimento, vendendo nosso patrimônio, até aqueles que nos tiram a Soberania e, ainda pior, o Governo de forma sórdida quer jogar a responsabilidade nas costas dos mais carentes e que precisam para sobreviver de toda uma estrutura social ligada a saúde, a educação, a moradia, a condições salariais etc. Então, causa revolta saber como as autoridades econômicas planejam resolver seus problemas de endividamento, jogando mais uma vez a conta nas costas do povo e cinicamente o culpando pelos seus perrengues de gestão ordinária e corrupta. Voltando ao “Arcabouço” fiscal vamos falar alto e a bom som que ele introduz mudanças significativas na política de reajuste salarial com armadilhas que nós leigos não conseguimos visualizar com clareza. A nova regra estabelece que o reajuste será limitado a 2,5% acima da inflação e, servirá como regra entre 2025 e 2030. Anteriormente o cálculo considerava a inflação mais a variação do PIB de 2 anos. E a regra agora é outra. Bom, durante a entrevista vamos abordar com mais detalhes este novo embate que se avizinha. Uma das contradições que quero explorar são as desonerações bilionárias para empresas etc. Temos Empresas estrangeiras do Pré- sal; Clubes de Futebol virando empresas com redução de impostos; Igrejas Evangélicas com isenção total de impostos federais e perdão de dívidas enormes; exportadores do agronegócio que vendem commodities sem pagar imposto de exportação. Vamos fazer a estimativa por baixo e ver o quanto isso representa? E a economia prevista com renúncias fiscais acumuladas por 10 anos. Vamos fazer essa conta na ponta do lápis?

Fazer alarde da Previdência é simples porque corta o direito dos pobres na carne uma vez que eles não sabem se defender. Agora, enfrentar grandes corporações, como Igrejas e elites econômicas que são financiadoras de campanhas e tem influência direta no Congresso não é tarefa fácil e daí só os fortes e lutadores pelo bem-estar social do povo podem peitar e denunciar.

Atualmente Denise Gentil vem usando seu conhecimento em Economia explorando à fundo as contradições da financeirização tanto a nível mundial como no Brasil e também as crises periódicas que vem produzindo. Neste contexto é importante entender o papel do Banco Central e quais os parâmetros adota para o aumento da Taxa Selic com a falácia de controle da inflação, mas, na verdade travando o desenvolvimento do país e das empresas.

Esse texto foi escrito com base em pesquisa de vários artigos e entrevistas de Denise Lobato Gentil, alguns em parceria com outros especialistas no tema como Miguel Bruno e Sérgio Lucas.

Niterói, 26 de abril de 2025.

Helena Reis