O Programa Falou e Disse recebe Fernando Siqueira.
SE O BRASIL PERDESSE O CONTROLE DA PETROBRÁS PODERIA AINDA SER CHAMADO DE PAÍS SOBERANO?
Vamos começar discutindo porque submetemos a soberania do Brasil à posse do petróleo. É válido misturar essas duas questões? Bem ou mal todos nós sabemos o quanto e porque o petróleo é visto como o minério básico para a humanidade. A dependência óbvia, fragrante, não é apenas do combustível que move todos os meios de transporte e de máquinas industriais e sim porque dele derivam centenas de produtos de variados tipos, e que os distraídos de plantão nem se dão conta. O fato é que o planeta tem uma dependência da matriz energética do petróleo, e isso ainda vai perdurar por muito tempo, pois todas as fontes substitutas são ainda em grau muitíssimo inferior às necessidades do hoje e do amanhã. Por isso falar em petróleo é falar em soberania nacional, falar em petróleo é falar de uma briga de cachorro grande, uma vez que todos os países dependem dele, mas não conseguem tê-lo em seu próprio território. Daí porque ele seja tão ambicionado e, ao longo do último século e do atual vem sendo motivo de guerras e disputas de todo o tipo.
Fazendo uma síntese vamos mencionar alguns locais do Planeta onde essa ocorrência se deu de forma singular: Oriente Médio com predomínio na Arábia Saudita, Irã, Iraque, Kuwait, Emirados Árabes; América do Norte: EEUU e Canadá; América do Sul: Venezuela e Brasil; Europa: Noruega e Rússia; Ásia: Azerbaijão.
O petróleo foi formado nas profundezas da terra ou do mar, fruto da decomposição de material orgânico milenar, depositados em bacias sedimentares e trabalhado de forma incansável pelas bactérias se transformando em óleo e gás. Prá que mencionar isso? Justamente porque temos de nos antenar para o sistema transformador da vida e que pode ocorrer a nosso favor ou contra. Essa massa orgânica acumulada e diversificada ocorreu em determinadas partes do planeta e tem a ver com o tipo de seres viventes ou não, de origens diversas que alí existiram. Portanto, os países do planeta Terra, quando essa riqueza foi descoberta logo constataram ter sido ou não agraciados por ela.
No caso do Brasil a certeza de sermos detentores desse privilégio, foi não só demorada como sofreu boicotes vindo de todos os lados principalmente dos interessados internacionais de plantão. Basta dizer que o 1º poço moderno foi aberto longe daqui em agosto de 1859 no Estado Americano da Pensilvânia pelo coronel Edwin Laurentine Drake enquanto a nossa Petrobrás só foi criada um século depois em outubro de 1953 no Governo Getúlio Vargas como detentora do monopólio. Isso quer dizer que ignoramos, como um “povo bobinho” que somos, essa ambicionada riqueza por tanto tempo? Nada disso, algumas décadas antes da criação da Petrobrás Monteiro Lobato já proclamava a existência do petróleo em território brasileiro através de sua literatura: “O Poço do Visconde”, e “O Escândalo do Petróleo”. Lobato travou uma luta visceral pelo petróleo brasileiro. Empreendeu diversas missões, apelou para as autoridades, criou empresas de prospecção e exploração, apresentou denúncias como a existência de 2 grupos estrangeiros, um deles americano de olho no nosso petróleo. Em ações políticas diretas escreveu cartas ao Presidente Getúlio Vargas quando relata o boicote sofrido por técnicos estrangeiros vindos ao Brasil fazer prospecção geológica. Ou seja, sofremos na verdade um conluio a nível internacional para que desistíssemos da riqueza antes mesmo de confirmar sua existência. Não podemos deixar de mencionar o racha que houve no Senado a propósito do ato de monopólio. Um grupo a favor, e outro contra. A título de ilustração o Senador Lundulpho Alves (PTB Bahia) repeliu argumentos, que nem merecem ser citados dizendo: “As empresas estrangeiras, representantes do monopólio internacional do petróleo, não devem contribuir, seja com pouco dinheiro, seja com muito, porque são perigosas para o interesse nacional”. O pesquisador Celso Carvalho, especialista na história do petróleo brasileiro diz que os “trustes” eram assustadores naquele momento em que ganhamos a queda de braço com os que se opunham ao monopólio brasileiro ou ao “Petróleo é nosso”! E através da Lei 2004 surge a PETROBRÁS como monopólio estatal da exploração, refino e transporte de petróleo.
Entre 1950 a 1980 houve uma grande expansão da Petrobrás a nível estratégico quando constrói refinarias, oleodutos, navios, centros de pesquisa (CENPES) que possibilitou a descoberta de grandes reservas nacionais. É verdade que no início não contava com grande produção de petróleo, mas, mesmo assim investiu no preparo e capacitação tecnológica de seus quadros formando seus engenheiros e técnicos sem depender de suporte internacional. Com isso, pouco a pouco tornou-se um polo importante da resistência do país e um símbolo nacional de soberania. Assim, pode resistir galhardamente à pressões externas que reivindicava a abertura da empresa dando acesso ao capital estrangeiro. Mesmo durante a ditadura militar a PETROBRÁS foi preservada como estatal forte, apesar das ameaças e sabotagens que sofreu neste período, estimulada principalmente pela mídia hegemônica. Na tentativa de desqualificá-la, se tentava passar uma imagem de Empresa ineficiente, inchada e arcaica. Também nesse período houve o recrudescimento dos “lobbies” de empresas estrangeiras como a ESSO, TEXACO para tentar penetrar e operar em território brasileiro.
Na década de 70 (entre 73 e 79) a Petrobrás enfrentou a crise do petróleo com grande eficiência e criatividade investindo em álcool combustível e exploração em alto-mar. Data dessa época a exploração na Bacia de Campos símbolo que marca o início da virada energética do país. A grande inovação vem na década de 80 quando o pioneirismo da Petrobrás atinge as raias da criatividade e inovação. Torna-se então líder mundial em tecnologia de exploração em águas profundas exercendo um papel sem paralelo no planeta. Ainda nesse período áureo criou a BR Distribuidora com a função de ampliar seu papel no abastecimento nacional.
As dificuldades econômicas do Brasil em final dos 80 e início dos 90 motivada por crises fiscais e inflação teve reflexos imediatos no prestígio da Empresa. Foi o momento da mudança de narrativas e preparo para um novo modelo econômico conhecido como neoliberalismo a ser ao fim e ao cabo implantado no Brasil durante o Governo FHC. As ameaças iniciais contra a nossa PETRO já se esboçam desde o Governo Collor mas com as resistências sociais e políticas nenhum objetivo pode ser alcançado.
O Governo de FHC em seus dois mandatos (1995-2002) foi tudo de ruim que a PETROBRÁS não merecia. Foi o divisor de águas na sua história, quando deixou de ser um símbolo inconteste da Soberania Nacional para ser uma empresa submetida ao mercado financeiro global. Apesar do seu nome ser mantido, sem brincadeira, quiseram trocá-lo por PETROBRAX muito mais internacional. Entretanto sua lógica de atuação mudou radicalmente. As Leis foram modificadas, uma delas a 9 478/1997 colocou fim ao Monopólio Estatal do Petróleo em vigor desde 1953. Com isso em consequência do ato, empresas mesmo as estrangeiras passaram a explorar, produzir, refinar e vender petróleo no Brasil.
Foi criada a ANP (Agência Nacional do Petróleo) para regular esse “novo mercado” e pasmem os leitores a própria Agência passou a agir como facilitadora da entrega. A lógica ou o ponto de vista mudou literalmente de lado, virando mercadoria à venda no mercado e o seu papel de recurso estratégico nacional virou piada. E isso foi só o começo do fim da Soberania Energética Brasileira. Ato contínuo como Empresa, agora transnacional começou a negociar ações na Bolsa de Valores de Nova York. Na calada da noite, sem alvoroço, sem povo na rua, sem noção do que estava acontecendo, a mudança da lógica ou objetivo da Empresa passou a ser outra: “MAXIMIZAR LUCROS PARA OS ACIONISTAS, em lugar de abastecer o Brasil com energia justa e acessível. De forma irônica pode-se dizer: “Foi ali que a Petrobrás virou um poço de lucros para gringos”. Mesmo com tanto estrago, FHC queria ter completado sua ação inglória chamada PRIVATIZAÇÃO. Houve inclusive uma preparação inicial para se chegar lá de forma completa Comendo pelas beiradas dividiu e reorganizou a empresa em subsidiárias num modelo conhecido como “fatiamento”. Vendeu partes da Empresa como ações da Petrobrás Distribuidora (BR). Mudou disfarçadamente o nome para Petrobrás S.A. com o objetivo de apagar sua identidade pública.
As consequências não tardaram a aparecer: Com o fim do monopólio empresas como a Shell, Chevron, Rapsol e Total passaram a explorar nosso petróleo e esvaziando consequentemente o papel da Empresa como guardiã estratégica da energia nacional.
Aí é claro que ato contínuo deu início aos leilões de blocos de petróleo e com a agravante de entregar áreas ricas ou riquíssimas por valores simbólicos a exemplo do que fez com a Vale do Rio Doce, através de estratégias como royalties baixos e contratos favoráveis às multinacionais. E ninguém no país percebeu que a PETROBRÁS tinha sido “privatizada”. FHC nunca foi julgado, condenado ou metido em prisão por traição à pátria, usufruindo como um rei do seu apartamentaço na CHAMPS ELISÉES em Paris.
E hoje a Petrobrás versão FHC cortou pesquisa não provendo o CENPES seu Centro de Pesquisa com verbas adequadas e, portanto, abrindo mão do desenvolvimento tecnológico nacional em prol do lucro para seus acionistas. Resumindo: “Transformaram a estatal do povo em empresa da bolsa”; “O petróleo continua brasileiro e os lucros estrangeiros”; Com FHC no poder o povo perdeu bolsa e alma”. Em 2022, a Petrobrás pagou R$ 215 bilhões em dividendos, sendo a maior pagadora do mundo. Quase metade desses lucros foi para acionistas privados estrangeiros ou seja: o povo brasileiro ficou com os preços altos e os estrangeiros com a grana.
2ª Parte
A DESCOBERTA DO PRÉ-SAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Como até o Papa Francisco diz que Deus é brasileiro, outro capítulo se deu com a descoberta do pré-sal em 2006 durante o Governo Lula e com destaque para o campo de Tupi renomeado Lula, na bacia de Santos. Foi uma das maiores descobertas de petróleo no século XXI no mundo e extremamente importante para o Brasil que passou para o ranking dos grandes produtores do planeta com estimativas de reservas em dezenas de bilhões de barris. Claro que esse fato teve grandes repercussões políticas e econômicas e fortaleceu a combalida Petrobrás como empresa estratégica de porte internacional. O modelo de exploração escolhido foi o de partilha ( Lei 12 351/2010) que garantiu maior controle estatal e mais retorno à União.
É evidente que esse presente da natureza reascendeu a cobiça das multinacionais e as pressões externas principalmente dos EUA, não se fizeram esperar. Quer aceitemos ou não por trás do golpe à presidenta Dilma em 2016 o petróleo vai estar lá como pano de fundo.
Logo, logo, no Governo Temer houve mudanças no marco legal, o controle estatal foi enfraquecido e a Petrobrás deixou de ser a operadora obrigatória. Ao vivo vamos saber de Fernando Siqueira todas as intrigas dessa guerra de bastidores. O fato objetivo é que está previsto um leilão de blocos do pré-sal, para esse mês de junho. Serão colocados à venda 28 blocos, sendo 4 novos e 24 autorizados. Será que novamente estão deixando passar a boiada? Não é por acaso que já fiquei bolada.
Niterói, 8 de junho de 2025.
Helena Reis